26/07/2007

Mar do Arquipélago da Madeira

Mar de São Vicente - Seixal - Madeira
(Foto do autor)


Introdução e Generalidades

O Mar que envolve o Arquipélago da Madeira deu glória histórica aos navegadores do século XV e XVI que deram um «novo mundo» ao Mundo até aí, ainda incógnito. Os navegadores destes séculos, que iniciaram viagens fora das linhas da costa ibérica e africana, de certeza que usaram muitas vezes a «Pedra de Cevar» (pedra de magnetite) para «cevar a agulha», à medida que perdia o seu magnetismo, lhes indicava o Norte e outros rumos no vasto oceano Atlântico desconhecido. Dos ventos e das suas direcções insondadas, não se livraram, bem como, de outros fenómenos de profundidade e superfície, das correntes marítimas, que transportavam por vezes brumas, onde o azul do mar desaparecia dando lugar ao horizonte cinzento. Só as ondas quebravam a monotonia da marinhagem quatrocentista e quinhentista.




Praia do Porto Santo
(Foto do autor)

Neste contexto, é de referir o aparecimento de sementes da flora mexicana e da flora das Caraíbas (West Índias), trazidas pelas correntes e atiradas todos os anos pelas ondas às praias do Porto Santo e da Madeira, entre as quais a lendária fava-de-Colombo (Entada gigas), a qual «justificou» a permanência de Cristóvão Colombo na Ilha do Porto Santo para o hipotético estudo do caminho marítimo para a Índia pelo Oeste. Assim as observações destes fenómenos em cada viagem no Atlântico acumularam o saber e a arte de navegar que se tornou em ciência até os nossos dias. De igual forma, acrescentou-lhes valores e atributos peculiares de raro saber para a descoberta de outros mares e continentes.



Mar, junto à Selvagem Pequena
(Foto do autor)



Batimetria do Arquipélago da Madeira e do Oceano Atlântico Norte




(Esta imagem não está conforme o original, foi alterada - Foto by www.math.uio.no/)

A base submarina e os edifícios vulcânicos onde assentam as ilhas do Arquipélago foram estudados pela Missão Hidrográfica das Ilhas Adjacentes (1936-1938). Das numerosas sondagens feitas nos mares da Madeira até 1938, conclui-se que estas emergem de abismos submarinos que as cercam, com profundidades oceânicas a partir de 1 a 4 milhas da costa, (ver as batimetrias nas cartas marítimas aqui apresentadas).




Madeira
(Fonte, Instituto Hidrográfico)

As fossas mais profundas, «entre a Madeira e a costa de África, a curta distância da ilha, medem 4.895 m de profundidade. Entre a Madeira e as Ilhas Canárias, 5.280 m. Entre a Madeira e os Açores, as profundidades têm 3.630 m e 5885 m. A 120 milhas da costa norte da Madeira, 5.055 m. Entre a Madeira e o Porto Santo, 2.800 m. Ao lado do banco submarino que liga a Madeira às Desertas, tanto para E como para W duma zona de 600 m de largura, as profundidades aumentam muito rapidamente para os 1.000 m. A uma distância de 15.000 m a S da Ponta do Garajau, 2.500 m. Por fora do Cabo Girão, 1.000 m. A uma distância de 23.000 m a NW na Ponta do Pargo, 3.300 m. A norte de São Vicente, a uma distância de 20.000 m, 2600 m. A 18.000 m a N da Ponta de São Jorge, 2700 m. A 9.000 m ao S da Vila do Porto Santo, 2.000 m. A 15.000 m a S do Ilhéu de Cal, 3000 m. A 20.000 m a SE do farol do Ilhéu de Cima 3.700 m. A 13.000 m a NE do Ilhéu de Fora 3.000 m. A SW do Bugio (Desertas), a 7 milhas de distância 3.100 a 3.925. Entre as Desertas e as Selvagens 4.542 m», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Costa sul da Madeira - Ponta do Garajau
(Foto do autor)

Segundo o Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens, a Ilha da Madeira tem «a maior largura na Ponta do Pargo, cerca de 5 milhas, na Ponta do Tristão e na zona desde a Ponta de São Jorge até Ponta de São Lourenço, cerca de 3 milhas, apresentando menor largura na zona do Porto do Moniz até São Vicente e em quase toda a costa sul.»
As «batimétricas de maiores profundidades desenvolvem-se paralelamente à orla do planalto insular, tendo um afastamento médio de 2 milhas desde os 100 m aos 1.000 m e de 2 a 5 milhas desde os 1.000 aos 2.000 m. A batimétrica de 20 m dista sempre menos de 1 milha da linha da costa, porém, a Baixa do Porto da Cruz, descoberta pela referida Missão oceanográfica, está situada a distância um pouco maior. Esta baixa foi descoberta, em 1937, pela Missão Hidrográfica das Ilhas Adjacentes a 68º NE do Ilhéu do Porto da Cruz e à distância de 1.450 m deste. É formada por uma rocha com a área aproximada de 1.000 m2 até à batimétrica de 20 m, de forma alongada, na direcção NE-SW. A profundidade ali é inferior a 8 m na parte NE. Esta rocha encontra-se numa zona de fundos de areia com a profundidade média de 40 m. A 51º SE do mesmo ilhéu e à distância de 920 m, existe também uma rocha a uma profundidade inferior a 5 m, a qual se encontra numa zona de fundos de areia com a profundidade média de 17 metros e meio», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).



Costa Norte da Madeira - Ilhéu da Janela - Porto do Moniz
(Foto do autor)

Adentro do mar adjacente à linha da costa «existem baixios, orlando as quebradas e fajãs, e algumas rochas imersas e mais afastadas que formam a Pedrinha do Daniel, a Baixa da Girarda, a Baixa de S. Pedro, a Baixa do Cabeça e outras rochas mais próximas, sempre imersas, mas onde o mar rebenta com frequência, que são: a Baixa da Cruz, Baixa da Aguagem, Baixa da Badajeira, Baixa de São Jorge, Baixa do Buraco, Baixa da Ribeira do Porco, Baixa do Banco do Boi, Baixa do Seixal, as Baixas do Furado, Baixa da Ponta da Fajã da Ovelha, Baixas dos Carriços, Baixas da Ponta Pequena, Baixa da Vila da Ponta do Sol, Baixa da Ponta da Cruz e Carneiro do Lido». No Porto Santo, «a linha de 100 braças estende-se além do extremo sul do Ilhéu de Baixo, à distância de 3/4 de milha e geralmente a 1 milha para NE do Ilhéu de Cima. À distância de 1 ¼ de milha, ao norte da costa, na direcção NE, a profundidade tem apenas 10 braças sobre o banco que cerca o Porto Santo, e na costa NW atinge 100 braças à distância de 8 milhas, sendo a profundidade geral de 25 a 35 braças. O fundo é de areia branca, rocha, corais, conchas e seixos», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Porto Santo
(Fonte, Instituto Hidrográfico)

A costa norte do Porto Santo «tem mar limpo e fundo fora dos 20 m, a menos de 1 milha da linha da costa, dentro da qual basta um resguardo de meia milha. Costa sul, mar limpo e fundo fora de igual batimétrica da costa anterior. Costa Leste, tem a mesma batimétrica, afastando-se esta menos de meia milha da linha da costa da ilha e da dos ilhéus, e só praticável com bom tempo sobre os seus escolhos. Costa oeste, idêntica limpeza e profundidade das batimétricas anteriores, mas exigindo resguardo e bom tempo para inteira segurança quarto de milha da costa contra os baixios e baixas da ilha e dos ilhéus circunjacentes.»
Na costa sul Porto Santo, «desde a Calheta ao Penedo, o mar adjacente a toda a praia é limpo, variando todavia de profundidades. O mar adjacente às arribas altas da Calheta e do Penedo até a Ponta do Incão, a partir da orla da praia, é sujo de baixios rochosos com rebentação de mar e baixas todas a menos de 500 m do areal, denominadas Baixa da Morena, Baixa da Baleia, Baixa do Sono e Baixa do Vieira», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).





Penedo, Pico de Baixo e Ilhéu de Cima - Porto Santo
(Foto do autor)

O mar adjacente aos ilhéus de Baixo e de Cima «é limpo de rochas submersas, mas sujo e perigoso nos boqueirões que oferecem passagem apenas por um estreito canal, aberto naturalmente em cada um, só isento de perigo na maré-cheia. Mas à distância de 1.050 m a E do Ilhéu de Baixo situa-se uma rocha submersa, a popular Baixinha, à profundidade de 13 m; e à distância de 50 m a S da Ponta do Paio Pequeno, do Ilhéu de Cima, existe outra rocha submersa à flor de água, onde por vezes, rebenta o mar.»
Na costa sul da Ilha, «desde a Calheta ao Penedo, o mar adjacente a toda a praia é limpo, variando todavia de profundidades. O mar adjacente às arribas altas da Calheta e do Penedo até a Ponta do Incão, a partir da orla da praia, é sujo de baixios rochosos com rebentação de mar e baixas todas a menos de 500 m do areal, denominadas Baixa da Morena, Baixa da Baleia, Baixa do Sono e Baixa do Vieira.»
«O boqueirão entre o Ilhéu de Ferro e a Ponta da Canaveira, corrupção de Canavieira, é dos mais profundos do arquipélago, medindo do lado E, ao centro, 21 m, mas sujo por um grande baixio do lado W», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).



Boqueirão Calheta, Ilhéu de Baixo ou da Cal - Porto Santo
(Foto do autor)

As Ilhas Desertas, a «distância de 1 milha da Roda do Navio, sobre o banco que se prolonga desde o extremo E da Madeira, a profundidade é de 45 a 75 braças, ancorando ali frequentemente os barcos de pesca. Este banco rodeia as Desertas à profundidade de 100 braças e à distância de 1 ½ milha a E, de 2 milhas a W, e de 1 ½ ao S. No extremo N do Ilhéu Chão, a profundidade sobe para 15 braças à distância de 1 milha. O fundo em volta das Desertas é variado, com areia fina de várias cores, corais, conchas e rochas», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Ilhas Desertas
(Fonte, Instituto Hidrográfico)

As Ilhas Selvagens, «as rochas submersas e descobertas estendem-se até à distância de 1 milha em quase todas as direcções. A N da Ponta Espinha, distante desta a uns 2.500 m, existe um rochedo muito perigoso para a navegação, submerso a 2,5 m de profundidade. Outro escolho de igual perigo é a Baixa de Noroeste, à profundidade de 4,5 m, até 1.000 m de distância da Ponta do Risco, na direcção WSW», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Ilhas Selvagens
(Fonte, Instituto Hidrográfico)




Correntes e Massas de Água de Profundidade no Arquipélago da Madeira e no Oceano Atlântico Norte


A bacia do Arquipélago da Madeira é banhada por massas de água de profundidade, denominada de «Água Central do Atlântico Norte» e por um fluxo de «Água Central do Atlântico Sul». Por vezes, o Arquipélago é também influenciado pela «Massa de Água Mediterrânica».
As correntes oceânicas de superfície existentes no Arquipélago da Madeira, segundo o Instituto Hidrográfico (1979), contextuam-se na circulação geral do sistema de correntes do Atlântico Norte, com origem na designada «Corrente do Golfo» (Gulf Stream). Uma fracção leste deste sistema de circulação é constituída pela «Corrente dos Açores», a «Corrente de Portugal Continental», a «Corrente das Canárias» e a «Corrente Equatorial Norte».





A «Corrente dos Açores» afigura um ramal que se separa para sul da «Corrente do Atlântico Norte». A «Corrente de Portugal Continental» corre a oeste da costa galega e portuguesa, numa região caracterizada pela circulação lenta entre as correntes do Atlântico Norte e a «Corrente dos Açores», além de marcar o limite norte da «Corrente das Canárias». A «Corrente das Canárias» é caracterizada genericamente por um fluxo de sentido norte-sul, ao longo da costa africana, que também influencia de certo modo as águas do Arquipélago da Madeira. Esta é uma corrente larga e lenta, de águas relativamente frias, dando origem a uma corrente de ressurgência (upwelling) costeira. Devido à predominância do anticiclone dos Açores, os ventos são a principal força impulsionadora destas correntes oceânicas. Em resumo, é a «Corrente do Golfo» (Gulf Stream), que por vezes, «humedece a atmosfera insular», mais influencia o Arquipélago da Madeira, não só no seu clima, como na sua flora e fauna, tanto terrestre como marítima.

«As correntes contornam as Ilhas pelos extremos, agrupando-se a sul.»
(NASA Visible Earth)

Dada à posição geográfica do Arquipélago e fazendo referência ao «Roteiro do Arquipélago da Madeira e Selvagens», elaborado pela Missão Hidrográfica das Ilhas Adjacentes (1936-1938), segundo as «Ilhas de Zargo», a «Corrente do Golfo» (Gulf Stream) é a que se faz mais sentir no Arquipélago da Madeira, principalmente entre a ilha da Madeira e da ilha do Porto Santo. «Corre no sentido de norte-sul a uma velocidade de cerca de 12 a 16 milhas por dia e incorre perpendicularmente na costa norte da ilha da Madeira, contornando-a pelos dois extremos oeste e leste, (Ponta de S. Lourenço e Ponta do Pargo), agrupando-se depois a sul. Entre a Madeira e o Porto Santo, no braço do mar vulgarmente conhecido pelo nome de Travessa, é onde se faz sentir mais esta corrente, que agita as águas daquela passagem de navegação obrigatória para a ilha do Porto Santo. Este braço de mar tornou-se lendário pelo terror que inspira ao povo madeirense obrigado a atravessá-lo em pequenas embarcações a vapor ou à vela, em demanda do Porto Santo».




Doca - Deserta Grande
(Ao fundo, o Bugio - Foto do autor)

«Pescadores e barqueiros, que tenham de navegar naquelas águas, não o fazem sem consultar previamente o aspecto das Ilhas Desertas, barómetro da Travessa, procurando em cada cor, névoa ou carneirinho (pequena vaga espumante) a indicação do estado do tempo no canal, e quanto mais claras se mostrarem as Desertas mais bonançoso se encontrará o mar. Também, junto à costa se observa a velocidade da corrente, vendo-se frequentemente correrem as águas por fora dos portos e enseadas com o ímpeto duma ribeira, o que, de tempos a tempos, é causa de sinistros para embarcações de pesca. Na Ponta do Pargo, o embate das águas correntes do Gulf Stream, que abraçam a Madeira, é, por vezes, tão forte que o mar encrespa-se espumante formando uma linha recta pela ponta fora, na direcção sul, até à distância de alguns quilómetros», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).



Marés



«A uma distância de cerca de 340.516 km da Terra, a Lua que influencia as marés, reflecte-se no Atlântico.»
(Foto by Celestia )

Dados observados pela mesma Missão Hidrográfica das Ilhas Adjacentes, as marés no Arquipélago são muito regulares, havendo diariamente duas preia-mares e duas baixa-mares. Na Madeira «fazem-se sentir regularmente as correntes de marés durante a enchente e a vazante, são em geral mais fortes em marés vivas e cerca de meia-maré, atingindo as maiores velocidades junto das pontas mais salientes das ilhas; em marés mortas são nulas ou muito fracas. Durante a enchente a onda de maré vem do quadrante SW, fazendo-se sentir as respectivas correntes ao longo da costa sul; durante a vazante, do quadrante NE, sendo as correntes em geral mais fracas e correndo as águas com maiores velocidades em frente das mesmas pontas. Quando prenunciam ou há temporais e ventos fortes, sofrem grande alteração na sua velocidade e direcção. As águas da enchente dividem-se na costa sul da Madeira, correndo para oeste e para leste a partir da zona da Ponta do Sol à Ponta do Jardim do Mar. Desta Ponta até à Ponta do Pargo as correntes marítimas desenvolvem-se geralmente de NWW. As correntes respectivas têm direcções paralelas ou ligeiramente inclinadas para a costa, sendo por vezes bastante fortes ao largo (zona dos 500 m de fundo aproximadamente)», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).



Costa Sul da Madeira
(Foto do autor)

«Junto das pontas tornam-se mais fortes dando lugar, por vezes, a encontros de águas ou encrespados como se observam na Ponta do Pargo e principalmente na Ponta de S. Lourenço, onde as suas velocidades atingem cerca de 2 milhas em marés vivas. As correntes de enchentes fazem-se sentir também na costa NW na Ponta do Tristão e junto do Ilhéu Mole, Porto do Moniz. As águas de vazante produzem fortes correntes para SSW na Ponta de S. Lourenço, para W na Ponta de S. Jorge e para SW no Ilhéu Mole, isto é, na costa norte; na costa NE são nulas ou muito fracas, excepto nas profundidades da Ponta de Barlavento. As correntes de vazante fazem-se sentir principalmente na costa norte, sobretudo na Ponta de S. Lourenço e Ilhéu Mole, onde atingem, em marés vivas, velocidade de 1,5 milhas. Sobre estas correntes exercem influência os ventos predominantes e as situações barométricas do Atlântico Norte.
No Funchal, sentem-se principalmente as correntes de enchente que têm direcções ligeiramente inclinadas para a costa ENE e atingem, em marés vivas, velocidades, de quase 1,2 milhas, a cerca de meia enchente. As correntes de vazante são em geral nulas ou muito fracas, correndo as águas para ENE e outras vezes para W», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Ilhéu Mole - Porto do Moniz
(Foto do autor)

No Porto do Moniz, «fazem-se sentir em marés vivas tanto as correntes de enchente como as de vazante, mas principalmente durante a enchente produzem-se correntes de reversa e estoques de água no começo dentro do porto, correndo as águas mais direitas durante a vazante, à velocidade de 1 milha. Estes estoques ou canas de água observam-se por vezes não só na Ponta do Pargo e junto do Ilhéu Mole, no Porto do Moniz, mas também à entrada da Travessa, depois de dobrada a Ponta de S. Lourenço e o Ilhéu da Cal. São como que canais de água corrente de norte para leste a velocidades superiores à da restante massa oceânica, que, ao serem atravessados por pequenas embarcações de 6 a 100 toneladas, fazem delas joguetes, sacudindo-as violentamente de bombordo para estibordo e vice-versa, segundo sua rota, não sem perigo de assombrarem, o que raramente sucede pelo rápido corte da cana-de-água. No Porto da Cruz, as correntes são em geral bastante fracas ou nulas», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Maiata - Porto da Cruz
(Foto do autor)

No Porto Santo, «as correntes marítimas atingem maiores velocidades nas marés vivas, correndo dos quadrantes sul durante a enchente, e do quadrante NE durante a vazante. Fazem-se sentir principalmente na ponta sul do Ilhéu de Cima onde as águas correm para NE, marés vivas, com a velocidade de 1 milha durante a enchente, e com a de 1,5 durante a vazante. Na Ponta do Ilhéu de Baixo, durante a enchente, correm para oeste ou este com a velocidade de 1 a 1,5 milhas, e para a SW com a velocidade de 1 milha, em marés vivas, durante a vazante. Estas marés produzem, por vezes, inesperadamente, fortes e traiçoeiros fluxos e refluxos nesta ilha. Durante a enchente, principalmente no mês de Agosto, inundam momentaneamente a praia na sua maior largura e alargam-na quase no dobro durante a vazante.
«Na Ilha da Madeira, o refluxo das marés vivas é, de tempos a tempos, causador de sinistros marítimos e perda de vidas pela violência com que as vagas embatem de surpresa contra embarcações acoitadas e desprevenidas, destruindo-as contra o calhau ou rochedos da costa.
As horas das marés «determinam-se pelas legais do Funchal, isto é, as aferidas duma hora a menos pelo tempo médio de Greenwich. Para conhecimento e estudo das marés, a Direcção Regional dos Portos da Madeira publica anualmente tabelas completas de todos os fenómenos ocorrentes», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).





Calheta, vista do Centro de Artes Casa das Mudas
(Foto do autor)

«Devido às correntes marítimas, a ondulação do mar, nos pontos em que aquelas se fazem sentir geralmente com maior velocidade, acusou os seguintes índices entre 1937 e 1945:
Em frequência, a percentagem média, na Ponta de S. Lourenço, foi de 0,6 com direcção nula, e 36,8 com NE, e a máxima, de 1,1 em nula e 60 com NE; na Ponta do Pargo, respectivamente, em média, 0,0 com direcção nula, e 81,0 com NW, e máxima de 0,0 em nula e 92,0 com NW; na Ponta do Sol, média de 0,0, com direcção S e 71,8 com W, e máxima de 0,0 com S e 93,0 com W.
Em velocidade de quilómetros à hora, na Ponta de S. Lourenço atingiu em média 0,0 com direcção nula e 2,6 com NE, e a máxima de 0,0 em nula e 7,0 com SW; na Ponta do Pargo, média de 0,0 em nula e 2,7 com NW, e máxima de 0,0 em nula e 8,0 com NW; na Ponta do Sol, 0,0 em nula e 1,6 com W, e máxima de 0,0 em nula e 7,0 com W.
Em direcções, as de maior frequência foram as de N, NE, E e SE; de maior velocidade, as dos quadrantes de SW, S, SE e NE na Ponta de S. Lourenço; NW, W, SW e NE na Ponta do Pargo; W, E e SW, na Ponta do Sol», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).



Ondulação forte ou «levadia»


Lugar de Baixo - Ponta do Sol
(Foto Madeira Arquipélago)

Na Madeira a ondulação forte é conhecida popularmente «levadia». As ondas gigantes saltam para as praias, galgam molhes e levantam a alturas consideráveis, como por exemplo: na Praia Formosa, na Ribeira Brava e no Lugar de Baixo. São bem conhecidas dos madeirenses! Este fenómeno marítimo aparece no mar do arquipélago no Outono e Inverno, «precedendo e acompanhando os temporais dos quadrantes do S e W e também quando há depressões fortes no Atlântico Norte. As ondulações fortes de SW, W e NW são as mais frequentes, tendo geralmente uma frequência anual de cerca de 20 dias, as muitos fortes, bem como as ondulações fortes de E, e SE, são muito raras, tendo uma frequência anual de 1 (dias). As ondulações moderadas e fracas são as mais frequentes, mas durante os meses de Abril a Setembro predomina a forte vaga produzida pela brisa de nordeste», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).
As «correntes, portanto, geradoras de movimentos marinhos, por diversos factores meteorológicos, criam vários estados de mar, alguns dos quais bastante prejudiciais à navegação, à pesca e às zonas costeiras», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Ondulação fraca do mar
(Costa sul da Madeira - Foto do autor)

Consoante, «a frequência, velocidade e direcção da ondulação provocada, tomam tais fenómenos estes nomes populares, de levadia, ou estado do mar de calema, aparentemente calmo fora da costa, mas arremetendo contra esta em ondas grossas e de forte erosão na praia. Se, porém, a levadia é fraca, prenuncia mudança de tempo ou salto de vento. O mar de calmaria ou simplesmente calma é o estado sem ondulação nem correntes, de superfícies lisa; mar estanhado (por corrupção de estagnado), mar de melânia, mar de azeite e mar choco, o mar que, por comparação, também se chama lago, cuja tranquilidade transforma a superfície num espelho reflector de imagens e criador de miragens, dando relevo à terra, encurtando o horizonte e avultando tudo acima da água, tão visivelmente que os mesmos corpos que sobrenadam abandonados, seja humano ou uma rolha, por assim dizer, avultam a olho nu a grande distância. O mar de marulho é cheio de vaga forte por efeito de ventos predominantes; o de cachão ou picado, o que encrespa o dorso em pequenas e leves vagas espumantes pela acção de ventos próximos que lhe varrem a superfície; mar da brisa, o que ondula e se remexe por força do vento de NE e dá às pequenas embarcações o balanço de parafuso, redemoinhando a cabeça e estômago dos navegantes sem poderem resistir ao sofrimento do enjoo; mar de águas tesas, o que corre com velocidade impeditiva de pesca; mar grosso, o de onda brava e alterosa, mar das tempestades dos quadrantes de S e SW, flagelo de embarcações e de vidas em terra e no mar», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).




Ondulação forte do mar
(Costa norte da Madeira - Foto do autor)




Temperatura, Salinidade e Densidade da Água do Mar


Pela mesma Missão Hidrografica foram recolhidos dados sobre a temperatura, salinidade e densidade da água dos mares do Arquipélago, (ver quadro abaixo). «Concluíram que a situação geográfica das ilhas como ainda a influência da corrente do Golfo, contribui para a establidade térmica da água. Assim, entre os zero metros e os 1.000 metros de profundidade, a temperatura do mar, desde a Madeira até as Ilhas Selvagens, varia apenas de 19,8° a 8,4°, a salinidade, de 36,830/00 a 35,500/00, a densidade, de 26,28 a 27 ,60», (Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens; Ilhas de Zargo - Adenda).





Fonte: Ilhas de Zargo - Adenda







Unidade naval estrangeira de visita à Madeira



Busca e Salvamento no Mar
(Search And Rescue – SAR)



MRRC Lisboa, Ponta Delgada e MRSC Funchal

A entrada em vigor, em 22 de Junho de 1985, da Convenção SAR (International Convention on Maritime Search and Rescue), 1979, Portugal criou os Sistemas Nacionais de Busca e Salvamento Marítimo e Aéreo, através do Decreto-lei n.º 15/94, de 22 de Janeiro, e do Decreto-Lei n.º 253/95, de 30 de Setembro, alterados pelo Decreto-lei n.º 399/99, (Publicado no Diário da República, I série A; N.º 240. 1999-10-14, p. 6912-6913)
Estes diplomas atribuíram responsabilidades, ao Ministério da Defesa Nacional, enquanto autoridade nacional, responsável pelo cumprimento da Convenção SAR- Autoridade SAR, e à Marinha e Força Aérea, enquanto coordenadores dos Serviços de Busca e Salvamento Marítimo e Aéreo.
A Madeira, possui um «Corpo de Salvadores Náuticos» - o SANASMADEIRA - Associação Madeirense para o Socorro no Mar. O SANASMADEIRA, actua em coordenação com o Subcentro de Busca e Salvamento Marítimo do Funchal (MRSC Funchal) e colabora com o Serviço Regional de Protecção Civil e Bombeiros da Madeira, igualmente, na área do socorro a náufragos e buscas subaquáticas, missões que normalmente estão regulamentadas e atribuídas aos Corpos de Bombeiros.
As operações de Busca e Salvamento no Mar das Ilhas Selvagens estão atribuídas às Canárias (Espanha).




Zonas de Responsabilidade SAR
(Esta imagem não está conforme o original, foi alterada)




Zona Económica Exclusiva (ZEE) do Arquipélago da Madeira


Enquadramento legal:



Constituição da República Portuguesa

[…]
Artigo 5.º
[Território]

«1. Portugal abrange o território historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e da Madeira.
«2. A lei define a extensão e o limite das águas territoriais, a zona económica exclusiva e os direitos de Portugal aos fundos marinhos contíguos.
«3. O estado não aliena qualquer parte do território português ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo da ratificação de fronteiras.
[...]


Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira

[…]
Artigo 3.º
[Território]

«1. O arquipélago da madeira é composto pelas ilhas da Madeira, do Porto Santo, Desertas, Selvagens e seus ilhéus.
«2. A Região Autónoma da Madeira abrange ainda o mar circundante e seus fundos, designadamente as águas territoriais e a ZEE, nos termos da lei.
[...]



A fiscalização da Zona Económica Exclusiva (ZEE) do Arquipélago da Madeira cabe à Autoridade Marítima nos termos do Decreto-Lei n.º 43/2002, e demais legislação aplicável, e aos serviços e organismos do Governo da Região Autónoma da Madeira. Neste âmbito, é de salientar o importante contributo que a Marinha de Guerra Portuguesa tem prestado à Região.



Zonas Económicas Exclusivas de Portugal

A Zona Económica Exclusiva de Portugal (ZEE) é constituída por 3 áreas: Portugal Continental, Madeira e Açores. Confina com as ZEE de Espanha e de Marrocos.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar, adoptada em 1982, atribui a Portugal uma Zona Económica Exclusiva (ZEE) de 200 milhas marítimas de largura. Desta forma e de acordo com a normas de direito internacional, Portugal tem direitos soberanos sobre a ZEE e sobre a Plataforma Continental, «para prospectar e explorar, conservar e gerir todos os recursos naturais vivos e não vivos, do fundo do mar e do seu subsolo, e das águas sobrejacentes, bem como sobre todas as outras actividades que tenham por fim o estudo e a exploração económica da zona, tais como a produção de energia a partir da água, das correntes e do vento». Assim Portugal Continental e os arquipélagos dos Açores e da Madeira têm uma das maiores ZEE da União Europeia, que confina com as ZEE de Espanha e de Marrocos. A Zona Económica Exclusiva (ZEE) do Arquipélago da Madeira compreende 200 milhas marítimas de largura excepto junto às Ilhas Selvagens onde esta faz fronteira com a Zona Económica Exclusiva de Canárias.




Levantamentos Hidrográficos
Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental
(Ministério da Defesa Nacional)

Actualmente procede-se a novos estudos para proposta de extensão da Plataforma Continental de Portugal, para além das 200 milhas náuticas e também na prospecção e exploração desses recursos naturais vivos e não vivos, do fundo do mar.
O reconhecimento das potencialidades do solo e subsolo marinho afecto à ZEE da Madeira será de extrema importância para a economia do Arquipélago designadamente nos recursos minerais em domínio profundo, designadamente na existência ou não de manganês e cobalto. Não menos importante é os recursos pesqueiros e a exploração de depósitos de inertes (areias e cascalhos).




Mercado - Funchal
(Foto Madeira Arquipélago)

Dados da Comissão Europeia (Pescas), a «produção pesqueira na Madeira estabilizou se em cerca de 8000 toneladas (8072 em 2004). Em meados dos anos 90, chegava a cerca de 14 mil toneladas. A pesca dos tunídeos constitui quase 37% da totalidade dos desembarques. As capturas de tunídeos registaram variações consideráveis, devido a alterações de natureza oceânica ainda mal conhecidas. Das 8851 toneladas registadas em 1995, passou se para menos de 700 toneladas em 2000, aumentando para as 3000 toneladas registadas actualmente. O peixe-espada preto, uma espécie de águas profundas, representa 46% dos desembarques. Em 2004, totalizava cerca de 4000 toneladas. Alvos da pesca costeira, os pequenos peixes pelágicos (o chicharro ou carapau e a cavala) representam 13% das capturas, contra os escassos 3% a 4% representados pelas espécies demersais (pargo, abrótea, cherne, garoupa de rolo, goraz, etc.).




Venda de peixe - Mercado - Funchal
(Foto Madeira Arquipélago

Para aumentar a diversidade das espécies presentes nas águas da ilha, foram construídos dois recifes artificiais com ajudas comunitárias, estando ainda prevista a construção de mais dois. Um estudo de impacto efectuado nas imediações do primeiro recife, construído em 2000, revelou que o número de espécies aí presentes tem vindo a aumentar desde então (registando, nomeadamente, quantidades significativas de sargo, xaréu bicudo, salmonete, boga-do-mar, dobradiça, charuteiro, etc.)».
Também de forma a conhecer outros recursos pesqueiros foram efectuados estudos de novas espécies e possível viabilidade económica, que por tradição não são pescados na Madeira, no âmbito do projecto PESCPROF, iniciado em 2003, que numa primeira fase serviu para ter uma ideia da biodiversidade profunda existente na Madeira e a segunda para estudar dois recursos específicos, nomeadamente o caranguejo da fundura e a gamba da Madeira. Neste âmbito é de referir o contributo importante da Estação de Biologia Marinha do Funchal, vocacionada para a investigação científica e desenvolvimento das ciências e tecnologias do Mar, em particular nas áreas da biologia e ecologia do litoral e de águas profundas. Nesta Estação, trabalham equipas de investigadores de Biologia Marinha do Museu Municipal do Funchal (História Natural) e do Laboratório de Biologia Marinha e Oceanografia do Departamento de Biologia da Universidade da Madeira.



Pesca, junto às fajãs do Cabo Girão
(Foto do autor)


O Arquipélago da Madeira além de possuir e duas Reservas Naturais (Ilhas Desertas e Ilhas Selvagens), que preservam o Mar que as envolve, tem duas Reservas Marinhas, (Garajau e Rocha do Navio), na Ilha da Madeira.
Habita os mares da Madeira, além das espécies residentes, o famoso Lobo Marinho (Foca Monge-Monachus Monachus), que deu nome ao lugar de Câmara de Lobos e também de apelido, ou apodo, ao seu proprietário João Gonçalves Zarco, ou Zargo, descobridor e donatário de uma das capitanias do Arquipélago.
São visitantes habituais dos mares do Arquipélago da Madeira, por não terem «inimigos naturais», a baleia comum, a baleia sardinheira, a baleia piloto, a baleia de bico, a baleia de bossas, o cachalote, o golfinho oceânico, o golfinho malhado do Atlântico, o golfinho comum, o golfinho riscado e outros.



Mar, junto à Baía de Machico
(Foto do autor)


De toda esta conhecida riqueza natural, o Arquipélago esconde segredos nas profundezas dos seus mares, onde madeirenses descobriram com «linhas e anzóis», e outros tentaram saber mais através de outros meios e novas tecnologias, para bem da ciência e do conhecimento Universal. Nesta perspectiva se transcreve este interessante artigo das Ilhas de Zargo por se achar pertinente e peculiar para o tema trabalhado.

A pesca do peixe-espada preto

(Foto Madeira Arquipélago)


«Nunca ninguém viu um peixe-espada preto vivo»
[…]

«O peixe-espada Preto classifica-se modernamente no grupo dos percomorfos subdivididos em muitas subordens das quais existem oito representações nos mares do arquipélago madeirense. Este peixe é da subordem dos Triquiuroideos de que há duas famílias na Madeira, a dos Gempilídeos, a mesma do Peixe-Coelho, e a dos Trichiurídeos, a da espada preta. (…) A desova deste peixe faz-se de Novembro a Dezembro, sendo calculado em 300.000 o número de ovos depostos por cada fêmea. Mede geralmente 1m de comprimento e 10 a 12 cm de largo na parte abdominal; a pele é brilhante e viscosa. Por efeito da descompressão experimentada ao subir da profundeza à superfície do mar, o estômago projecta-se pela boca fora ou pelos opérculos, e o ventre apresenta-se fendido em sulcos longitudinais. Pelo seu sabor, é o peixe-espada preto para muita gente muito mais delicado que qualquer atum, e como factor na economia madeirense pode talvez dizer-se que representa, depois do atum-patudo, a maior quantidade de massa alimentícia arrancada ao mar anualmente. Constitui uma das pescas industriais que, na maior profundidade, se exercem em todo o mundo. É uma indústria privativa, pode dizer-se, da colmeia piscatória da Câmara de Lobos que, durante todo o ano, com este peixe abissal abastece em particular a população do litoral Sul da Madeira.
O processo de captura deste peixe não deixa de oferecer certo interesse. Duas linhas independentes uma da outra, suspensas verticalmente sem tocar o fundo, e uma de cada lado da pequena embarcação constituem o aparelho desta pesca. Pode medir cada uma delas 1.500 a 1.600m, e excepcionalmente 1.800 como usaram em anos passados, e só a partir de 800 a 900 m contados da superfície é que são guarnecidas de estrôvos ou pequenas linhas laterais em número de 140 a 180, cada uma com um anzol, levando a linha madre na sua extremidade inferior uma pequena pedra - o pandulho- que a fará afundar. É na zona que medeia entre 800 e 1.600 m que o Aphanopus Garbo se deixa de ordinário fisgar nos chambiões - designação pela qual são conhecidas as peças inferiores da linha, guarnecidas de anzóis e correspondentes ao horizonte batimétrico deste peixe. O colher duma linha leva ao pescador duas horas. Cálculos científicos dão uma temperatura inferior a 7° C à zona habitada pela espada. O primeiro pesqueiro foi ao Sul da Madeira, numa zona chamada Altio, que se estende de Leste a Oeste, e onde os aparelhos mais extensos de pesca não chegam a tocar o fundo. Nos últimos anos descobriu-se outro pesqueiro na Costa Norte da ilha, cuja exploração diária é feita por barcos de Câmara de Lobos que remetem todo o pescado para os mercados da Costa Sul. A pesca mais abundante é feita de noite ou de dia com o céu bastante escuro, porque o peixe sai do abismo e sobe como que fugindo ao frio intenso e da extrema escuridão. Não há época própria para esta pesca, dependendo apenas do estado do mar, porque todo o ano aparecem espadas com invariável abundância nos seus constantes pesqueiros. (…) O peixe-espada preto por suas qualidades alimentares, sua raridade no mundo, a profundidade do seu meio de vida, sua estranha pesca, sua propriedade comercial e sua abundância nas fossas marítimas da Madeira atraiu tanto a atenção e o interesse dos cientistas que, em 29 de Junho de 1966, o batiscafo Archimede, submarino francês de pesquisas zoológicas, com potencialidade para descer a 11.000m de profundidade, demandou o nosso arquipélago para localizar os pesqueiros de espadas pretas, estudá-las e sabê-las pescar. Nessas pesquisas, o Archimede mergulhou naquela data, às 21 horas, na posição 32° e 35’ Norte e 17° e 10,4’ Oeste. Durou este submersão cerca de 10 horas à profundidade de 2.750m.
A bordo encontravam-se os cientistas Comandante Houot, Dr. Basseau, do Instituto Oceanográfico de Paris e o Eng. Jean Jarry do Centro Nacional de Pesquisas Científicas de França que efectuaram observações sobre o meio natural do peixe-espada preto cuja abundância é extraordinária na Madeira.
As pesquisas efectuadas neste dia foram fotografadas e filmadas para estudos dos sábios naturalistas.
Esta imersão fez-se objectivamente num pesqueiro de espadas pretas, um dos mais abundantes da Madeira, a 8 milhas ao Sul da Ponta do Sol. Um velho e experimentado pescador da Câmara de Lobos acompanhou a missão científica, a bordo do navio apoio Marcel le Bihan onde preparou as linhas providas de muitos anzóis, aparelho tradicional de pesca do peixe-espada preto, que foram presas exteriormente no fundo do casco do submarino Archimede por homens-rãs franceses. Esta operação foi todavia infrutífera para os cientistas, relativamente ao conhecimento da vida do peixe-espada e à visão natural e fotográfica dum espécime vivo daquele animal. Confirmou-se assim a lenda corrente entre os pescadores de que a vida da espada-preta é um mistério ainda por desvendar, pois ninguém até hoje conseguiu ver emergir vivo das águas, um exemplar daquela espécie. E, os cientistas, nem vivo nem morto, porque as linhas com que mergulharam iscadas subiram a lume de água com a isca intacta. Os três mergulhadores do Archimede sempre tiveram uma refeição de espada a 2.000m de profundidade, mas de dois exemplares pescados da superfície do Oceano à linha do pescador de Câmara de Lobos, de bordo do navio apoio Marcel le Bihan. Porque a espada não sai do abismo nem se mostra a ninguém. Guarda-se no segredo das águas, no silêncio e na escuridão da fossa abissal. Foram todavia muitos proveitosos os mergulhos do Archimede como reveladores dum fenómeno raro para a ciência noutras águas, a existência duma infinidade de seres vivos nas profundidades exploradas. Por isso são de opinião aqueles cientistas que o Atlântico que banha esta ilha é uma zona única no Mundo onde se criam peixes a mais de 4.000m abissais».

[…]



In: Ilhas de Zargo

Peixe Espada Preto
(Foto Madeira Arquipélago)



Bibliografia:
*
GONÇALVES, Ângela Borges e NUNES, Rui Sotero (1990). Adenda às Ilhas de Zargo. Câmara Municipal do Funchal. Funchal.
INSTITUTO Hidrográfico. Carta Náutica. Arquipélago da Madeira N.º 33101.
INSTITUTO Hidrográfico. Roteiro do Arquipélago da Madeira e Ilhas Selvagens (1979). 2.ª Edição. Lisboa.
PEREIRA, Eduardo C. N. (1989). Ilhas de Zargo. 4.ª Edição. Câmara Municipal do Funchal. Funchal.
Links: Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental. INSTITUTO Geográfico Português - Atlas de Portugal - Um país de área repartida – «O Mar que nos envolve», por Henrique Souto. Instituto Hidrográfico.
*
Baía do Funchal
(Foto do autor)

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