30/08/2008

AREEIRO (Sítio do), CHÃO DO AREEIRO E PICO DO AREEIRO

Pico do Areeiro
(Foto do autor)

AREEIRO - O termo areeiro no vocabulário popular madeirense, significa lugar ou local onde existe um depósito de areão ou uma área de terreno areento, conforme define o Padre Fernando Augusto da Silva, no seu opúsculo “Vocabulário Madeirense”, editado em 1950 pela Junta Geral do Funchal com prefácio do Cónego F. C. de Meneses Vaz. Assim, um areeiro na Madeira é um aglomerado ou depósito de piroclastos, provenientes de erupções vulcânicas explosivas. Estes materiais piroclásticos, por vezes, encontram-se alterados e argilificados pela acção dos agentes erosivos (chuva, granizo, neve, etc.) e são de granulometria variável. Os locais ou lugares de concentração destes piroclastos, são denominados pelos madeirenses com o topónimo de areeiro. São exemplos: o Chão do Areeiro, o Pico do Areeiro e o sítio do Areeiro, na freguesia de São Martinho no Funchal.


Pico do Cedro, Pico do Cidrão, Pico Grande e Paul da Serra
(Vistos do Pico do Areeiro - foto do autor)

Chão do Areeiro


Chão do Areeiro e Chão dos Balcões
(Vistos do Pico do Areeiro - foto do autor)


Pequeno planalto localizado a sudeste do Pico do Areeiro na área geográfica do Parque Ecológico do Funchal entre as altitudes de 1598 e 1594 metros (Carta Militar). Confronta pelo sul com o Chão dos Balcões (Chão da Lagoa ou das Lagoas), a Oeste com o Pico dos Melros, a Leste (Achada Grande) e a Norte, com a Estrada Regional n.º 202 (ER 202). A sua designação toponímica deve-se à sua localização junto ao Pico do Areeiro. Neste mesmo planalto existe casas de apoio do Parque Ecológico e o Posto Meteorológico do Areeiro.


Chão do Areeiro e Poço da Neve
(Pico dos Melros atrás do Poço da Neve - foto do autor)


As suas pequenas encostas são circundadas por vegetação de altitude, onde predomina a urze molar ou betouro (Erica arborea), a urze das vassouras (Erica scoparia) a uveira da serra (Vaccinium padifolium), o loureiro (Laurus azorica), o perado (Ilex perado) e a sorveira ou tramazeira (Sorbus maderensis). Esta última da família das rosáceas, é uma pequena árvore de folha caduca e flores brancas, que produzem cachos de frutos vermelhos. Está classificada como um endemismo madeirense muito raro. O seu efectivo, não atinge uma centena de indivíduos. Este núcleo de vegetação de altitude constitui «um dos melhores de toda a Ilha da Madeira», segundo Raimundo Quintal (2004, Levadas e Veredas da Madeira).


Sorveira ou Tramazeira
(Sorbus maderensis - foto do autor)


Muito próximo deste planalto, nascem as levadas do Barreiro e do Blandy ou da Quinta. A primeira nasce escoltada por um núcleo de urzes, na sua maioria do género Erica scoparia, muito perto do Poço da Neve. A segunda, nasce a auferir água da Fonte do Juncal, junto ao Posto de Transformação (de cabine alta ou torre), contíguo à Estrada Regional n.º 202 (ER 202), encontrando-se localizado à direita de quem sobe para o Pico do Areeiro.
Junto ao Chão do Areeiro e na direcção do Pico dos Melros, iniciam-se uma série de percursos por levadas e veredas, para o Parque Ecológico do Funchal e para as serras de Santo António (Levada da Negra, Montado do Paredão, Alegria, Pomar do Miradouro, Curral Velho, Barreira, etc.).


Levada do Blandy ou da Quinta
(À esquerda, o Chão do Areeiro e ao fundo o Pico do Areeiro - foto do autor)




Pico do Areeiro


Pico do Areeiro
(Visto da Achada do Teixeira - Santana - foto do autor)


Localizado no Maciço Montanhoso Central da Ilha da Madeira, o Pico do Areeiro com 1818 metros de altitude, distingue-se ao longe pelas suas escarpas avermelhadas e arroxeadas, formadas por areeões (piroclastos), amparadas por filões e diques basálticos, guarnecidas por bombas vulcânicas e pelas escoadas cíclicas da actividade vulcânica, que fez nascer do Mar há cerca de 5 milhões de anos a maior ilha do Arquipélago da Madeira. Igualmente, o seu vértice geodésico colocado no o seu ponto mais alto e as antenas repetidoras de telecomunicações, junto ao Miradouro do Juncal, não o confundem no horizonte com outro imponente pico do sistema montanhoso madeirense. Rodeado por barrancos e vales profundos, o Pico do Areeiro é condiscípulo dos picos mais altos da ilha. Este é o terceiro pico mais alto, depois do Pico das Torres, com a altitude de 1851 metros, e do Pico Ruivo, com a altitude de 1862 metros.
Os concelhos do Funchal, de Câmara de Lobos e de Santana, entroncam-se geograficamente neste monumento natural.


Fajã da Nogueira
(Vista do Miradouro do Juncal - Pico do Areeiro - foto do autor)


Do Pico do Areeiro, descortina-se horizontes de largas vistas para a vertente norte da Madeira, envoltos em vales verdejantes de Laurissilva (Achada do Teixeira, Santana, Fajã da Nogueira, Ribeiro Frio, São Roque do Faial, Faial e Porto da Cruz). A nordeste, figura por vezes no mar a Ilha do Porto Santo. Para sudeste, os olhos percorrem o planalto de Santo António da Serra (Santo da Serra) e sentem a sinuosa Ponta de São Lourenço, logo seguindo-lhe as Ilhas Desertas. Estas, fazem-nos movimentar para sul à descoberta do Funchal, mas apenas vemos o Chão dos Balcões (Chão da Lagoa ou das Lagoas) e as Serras de Santo António, com os seus picos mais relevantes: o Pico Escalvado e o Pico do Cedro.


Pedra Rija, Pico do Gato e Pico das Torres
(Vistos do Pico do Areeiro - foto do autor)

Todo este cenário natural complementa-se para Oeste, com as vistas sobre os picos: do Cidrão e o Grande, e o planalto do Paul da Serra despido de vegetação. A pouca distância, um olhar percorre a vereda que palmilha a cordilheira central, entre areeões, diques e filões. Os mais atentos, descobrem o Pico Ruivo associado ao Pico das Torres e ao Pico do Gato, que unem os vales profundos para norte, o vale da Fajã da Nogueira, e para o sul, o vale do Curral das Freiras. Neste, as casas, os palheiros e os socalcos (poios) cultivados, identificam a persistência dos madeirenses no amanho dos séculos na conquista do relevo da Madeira.


"Oásis num deserto de montanha"
Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal

(Cedros-da-madeira - Juniperus cedrus ssp. maderensis, Massarocos - Echium candicans e Estreleiras - Argyranthemum pinnatifidum - foto do autor)

Ali tão perto, esta persistência mantêm-se viva e presente, pela conduta de cidadania da Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal, que transformaram as encostas do Areeiro, consideradas um «deserto de montanha», consequência do pastoreio desordenado de ovelhas e de cabras, aliado a um clima inóspito, com grandes amplitudes térmicas, geadas, neve e granizo, ventos fortes e variações da humidade do ar e do solo no Inverno e no Verão. Esta associação, composta por gentes persistentes e liderada pela persistência e vontade de servir, conseguiram devolver ao terreno areento, a vegetação que naquele local existia há 500 anos, antes da ocupação humana, nesta parte do Atlântico Norte. E neste local, crescem os piornos (Teline maderensis), as andríalas (Andryala glandulosa ssp. varia), os massarocos (Echium candicans), as estreleiras (Argyranthemum pinnatifidum), na companhia de loureiros (Laurus novocanariensis) e cedros-da-madeira (Juniperus cedrus ssp. maderensis). A esta reflorestação, que conta com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, juntou-se-lhes as armérias-da-madeira (Armeria maderensis), as leitugas (Tolpis macrohiza), os plantagos-da-madeira (Plantago maderensis) e os goivos-da-serra (Erysimum bicolor), transportadas pelo vento na mudança das estações.


Vegetação de Altitude
(Miradouro do Ninho da Manta - foto do autor)
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O Pico do Areeiro é também conhecido pela habitual presença da distinta Freira da Madeira (Pterodroma madeira), ave marinha e membro efectivo da família Procellariidae que ocupa e nidifica nesta área geográfica. Esta zona, está classificada como ZEC (Zona Especial de Conservação) e Zona Importante para as Aves (IBA). A Freira da Madeira é endémica da Madeira e está classificada como «criticamente ameaçada». É alvo de um "Plano de Acção" por parte da Comissão Europeia, com a colaboração com a Birdlife International, com um financiamento comunitário do Programa LIFE. Até ao início dos anos 70 do século XX, era considerada extinta.


Vereda do Pico do Areeiro - Pico Ruivo
(Vista do Pico do Areeiro - foto do autor)

De regresso, por pouco não nos esquecíamos de visitar o Poço da Neve, «mandado construir em 1813 por um italiano que fabricava sorvetes». Este edifício modelar, único no património cultural madeirense edificado, é propriedade da Câmara Municipal do Funchal desde 1936, inserido no Parque Ecológico do Funchal. Está localizado a 1600 metros de altitude à direita de quem desce para o sítio do Poiso pela Estrada Regional n.º 202 (ER 202). Este reservatório, «com a aparência de igloo dos esquimós», foi escavado no solo, «para manter as temperaturas baixas e impedir a fusão do gelo proveniente da neve e do granizo que caíam durante o Inverno, donde era retirado, nas estações subsequentes, para fabrico de sorvetes e utilização em hotéis e hospitais». Tem forma redonda, com um diâmetro de 6,3 metros e uma profundidade de 8 metros, construído por pedras talhadas (cabeças) de basalto e de cobertura hemisférica também construída por lascas (lajes) de basalto presas por argamassa de cal.
Monumento vivo madeirense, o Poço da Neve é classificado como de valor cultural (local) da Região Autónoma da Madeira, desde 30 de Julho de 1998. Em Portugal continental e na Europa, existem poços da neve em tudo semelhantes na sua função ao do Areeiro.


Poço da Neve - Parque Ecológico do Funchal
(Ao fundo, a cidade do Funchal - foto do autor)


Entretanto, os alísios vão carregando as brumas vindas de nordeste e de norte, deixando os visitantes na ignorância geográfica e no desnorte da imaginação à procura a sudoeste: da Ribeira Brava, da Ponta do Sol e da Calheta. No horizonte, não encontram o Porto do Moniz e a ilha fica mais pequena num mar de nuvens.




(A sudoeste)
(Foto do autor)


Sítio do Areeiro


Sítio povoado da freguesia de São Martinho, Funchal. Confronta com o mar junto à Praia Formosa.



Praia Formosa
(Sítio do Areeiro - São Martinho - Foto do autor)


Nota do autor:

Actualmente (Agosto de 2010), parte do conteúdo deste artigo feito no mês de Agosto de 2008, em consequência dos famigerados incêndios que ocorreram na Madeira, é surreal.


Bibliografia:

ASSOCIAÇÃO dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal. Desdobrável - Oásis num deserto de montanha. Funchal.
JARDIM, Roberto e FRANCISCO, David (2000). Flora Endémica da Madeira. 1.ª Edição. Múchia Publicações. Funchal.
FRANQUINHO, L. O. e COSTA, A. (1998). Madeira - Plantas e Flores. 16.ª Edição. Francisco Ribeiro e Filhos. Funchal.
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NEVES, Henrique Costa e VALENTE, Ana Virgínia (1992). Conheça o Parque Natural da Madeira. Secretaria Regional da Economia - Parque Natural da Madeira. Funchal.
OLIVEIRA, Paulo (1999). A Conservação e Gestão das Aves do Arquipélago da Madeira. Secretaria Regional de Agricultura, Florestas e Pescas - Serviço do Parque Natural. Funchal.
PEREIRA, Eduardo C. N. (1989). Ilhas de Zargo. 4.ª Edição. Câmara Municipal do Funchal. Funchal.
SERVIÇO Cartográfico do Exército (1974). Carta Militar. Serie P 821. Edição 1 - S. C. E. P. (Trabalhos de Campo de 1965). Lisboa.
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SILVA, Padre Fernando Augusto da (1950). Vocabulário Madeirense. Edição da Junta Geral do Funchal. Funchal.
QUINTAL, Raimundo (1994). Veredas e Levadas da Madeira. Secretaria Regional e Cultura. Funchal.
QUINTAL, Raimundo (2003). Madeira, a Descoberta da Ilha de Carro e a Pé. 1.ª Edição. Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal. Funchal.
QUINTAL, Raimundo (2004). Levadas e Veredas da Madeira. 4ª Edição. Francisco Ribeiro e Filhos Lda. Funchal.