(Barro, barreiro, barreiros, enxurros, lameiros e lamaceiros)
(Foto do autor)
A classificação clássica, assim como, a qualidade e características, de vários tipos de solo existentes no arquipélago madeirense, deram o nome a muitos sítios e lugares nas ilhas. De entre estes tipos de solo, para além dos denominados de massapez e salão, os terrenos com características argilosas (barro, barreiro, barreiros, enxurros, lameiros, lamaceiros), igualmente, converteram-se em topónimos.
Segundo o Elucidário Madeirense (Silva e Meneses, 1946), as «argilas contendo areias formam os barros, natureza de terreno que dá o nome a vários sítios chamados Barreiros». E, «o massapez é uma terra contendo grande quantidade de argila ferruginosa, pardacenta, conservando por muito tempo a água que embebe e o salão é avermelhado e menos denso». (…) «As argilas constituem uma massa formada de grande variedade de produtos terrosos, provenientes da decomposição de silicatos alumínios das rochas, especialmente das traquites. As mais antigas, endurecidas, contendo hidróxidos ferricos e carbonatos, acham-se intercaladas e cozidas entre camadas de produtos vulcanicos, recebendo o nome de laterites.» Ainda mais, adiciona o Elucidário (Silva e Meneses, 1946) que: «é devido aos sais de ferro que a maior parte das rochas das nossas encostas se desagregam, e assim se dá a preparação das novas terras (poios), deixando-as esboroar pela acção dos agentes naturais e retendo-as em pequenos tabuleiros de cultivo.»
Ponta Delgada
(À esquerda na foto, sítio dos Enxurros - foto do autor)
Gaspar Furtuoso (1522 - 1591), ao descrever a natureza dos solos (terrenos) da Madeira, diz-nos que: «é terra massapez pela maior parte, mais que terra preta, e outra, como ruiva, se chama salões». E sobre a ilha do Porto Santo, ainda mais acrescenta o mesmo autor, que nesta ilha a «terra é baixa, chã e golfeira, que do Sul ao Norte toda se lavra e dá muito pão, sendo dele para o Nascente tudo montes, serras e matos, e a terra, pela maior parte massapez, quase toda da qualidade de Alentejo.»
Na Madeira e Porto Santo, segundo A. Sarmento (1941), «os depósitos argilosos são abundantes em vários sítios que tomaram nomes indicativos da natureza do solo, como sejam: a Achada do Barro, Barreiros, Lameiros, Lamaceiros, Massapez, etc.»
Ainda segundo o mesmo autor, «a elaboração do barro pode efectuar-se e permanecer no mesmo sítio da sua formação, onde se encontram os barros de depósito, mas, vulgarmente, são arrastados pelas águas, vindo a acumular-se em outros lugares de nível inferior, constituindo as argilas ou barros de sedimentação.»
As argilas ou barros de sedimentação, «assentes no entrecosto de confluência, nos planos de ensopamento, nos cotovelos de enxurradas» (lamas superficiais ou enxurros) e nas «várzeas alagadiças» (lameiros ou lamaceiros), denunciam «a sua formação de arrasto, pousados em sedimento estaladiço, o sol coze os barros, evaporando a humidade que lhes dava coesão», como nos aclara A. Sarmento (1941).
Achada do Barro - Santo António da Serra
(Foto do autor)
Segundo Carvalho e Brandão (1991), «o carácter fortemente acidentado da ilha da Madeira é, em grande parte, consequência da erosão.» (...) E, que «são o resultado de erosão pelas águas superficiais, no geral, torrenciais, que escavam profundos rasgões, mais acentuados nos materiais piroclásticos, deixando paredes abruptas que frequentemente desabam, por acção da gravidade e por instabilidade grandemente aumentada por infiltração de águas em terrenos tão brandos e permeáveis.» Mais acrescenta o mesmos autores que: «os fenómenos de alteração actuaram nos vários pontos da ilha com intensidades diferentes, sobretudo em função da litologia, da altitude, dos declives e da orientação da exposição. São frequentes até à cota de cerca de 1 000 m as terras avermelhadas e amareladas, argilosas (massapez, salão); acima destes níveis, parece predominar a lexiviação das rochas que, assim, se tornam esbranquiçadas.»
Segundo Romariz e Prates (1986), citados também por Carvalho e Brandão (1991), «as argilas de alteração na generalidade dos materiais vulcânicos da ilha da Madeira correspondem, na maior parte dos casos, a substâncias amorfas (…)». «A rápida erosão da capa superficial das rochas, sejam elas lávicas ou piroclásticas, não permite, em consequência do vigor dos declives, a estabilidade mecânica dos perfis de alteração e a sua permanência ao longo das vertentes, necessária à génese dos minerais argilosos.»
Sítio da Ladeira e Lamaceiros - Arco da Calheta
(À esquerda na foto - foto do autor)
Segundo Furtado (1983), igualmente, citado por Carvalho e Brandão (1991) «a natureza das argilas dos solos da Madeira depende de vários factores conjugados entre si, de entre os quais ressaltam a pluviosidade e a temperatura, o tipo de rocha-mãe, a vegetação e, em particular, a altitude e o declive do terreno.» Nestas argilas, «em termos de espécies presentes, estão referidos minerais dos grupos da caulinite (caulinite, haloisite e metahaloisite), da clorite e da montmorilonite, gibbsite e materiais amorfos sílico-aluminosos (halofanas) e ferruginosos.»
Segundo os autores supracitados, «os materiais amorfos ferruginosos estão intimamente ligados às argilas, conferindo-lhes as tonalidades amareladas e acastanhadas tão comuns nos solos da ilha. Quando vermelhos, os solos revelam a presença de hematite impregnando as argilas, mineral cuja neoformação o autor (Furtado, 1983) considera anterior à génese do solo, por alteração hidrotermal, durante a deposição das escoadas.»
Sítio dos Salões - Porto Santo
(Foto do autor)
No Porto Santo, e novamente segundo Carvalho e Brandão (1991), «nas partes baixas predominam os abarracamentos numerosos e profundos, com a configuração de bad lands». Igualmente, existe uma «densa rede filoniana, de natureza essencialmente basáltica, associada aos depósitos sub-horizontais de bentonite». A bentonite, espécie de argila, conhecida naquela ilha por salão, ainda cobre os telhados das casas tradicionais, designadas por casas de salão.
Ainda, mais acrescenta Carvalho e Brandão (1991), que no Porto Santo, «são ainda consideradas de interesse» (…), as «pozolanas», outras espécies de argilas, «estas últimas exploradas, no passado, numa pequena ocorrência», perto da cidade daquela ilha. Ainda segundo os mesmos autores, «são consideradas de interesse local, certas argilas resultantes da alteração sub-aérea de traquitos, usadas em cerâmica.»
Na ilha do Porto Santo, existe potencialidades de aplicação na geomedicina, a «areia de praia e a bentonite», segundo Celso Gomes e João Baptista Silva (2001).
Actualmente na ilha da Madeira, não existe qualquer aplicação das argilas locais.
Desta forma e por aquilo que foi exposto, apenas nos resta no arquipélago os topónimos, que para além de corresponder às características dos vários tipos de solo no seu estado natural, nos recordam que as argilas ou barros e os seus derivados, foram usados pelos povoadores das ilhas.
Fajã do Barro - Porto do Moniz
(Foto do autor)
Assim, como topónimos existentes no arquipélago, podemos dar os seguintes exemplos: Achada do Barro (Santo António da Serra), Achada do Furtado do Barrinho (São Vicente), Achada dos Lameiros (São Vicente), Barreiro (Canhas), Barreiro e Feiteiras (Canhas), Barreiro (Santana), Barreiros (Caniço), Barreiros (Estreito de Câmara de Lobos), Barreiros (São Martinho), Barreiros (Ribeira Brava), Barros (São Vicente), Enxurros (Ponta Delgada), Fajã do Barro (Porto do Noniz), Fonte do Barreiro (Montado do Barreiro - Monte), Ladeira e Lamaceiros (Arco da Calheta), Lameiros (São Vicente), Lamaceiros, (Boa Ventura), Lamaceiros (Santana), Lamaceiros (Santo da Serra), Lamaceiros (Porto do Moniz), Lamaceiros (Terceira Lombada - Ponta Delgada), Lapa e Maçapez (Campanário), Lombo do Lameiro (Estreito da Calheta), Lombo do Maçapez (Tabua), Lombo do Salão (Calheta), Lombo do Salão (Gaula), Maçapez (Arco da Calheta), Massapez (Porto da Cruz), Montado do Barreiro (Monte), Pico dos Barros (São Vicente), Pico e Salões (Estreito de Câmara de Lobos), Porto dos Barreiros (Porto Santo), Roda e Maçapez (Campanário), Salão (Calheta), Salão (Canhas), Salão (Gaula), Salão (Santo António), Salão (Ponta do Pargo), Salão (Porto do Moniz), Salões e Levada da Madalena (Canhas), Salões (São Gonçalo), Salões (Porto Santo), etc..
O topónimo Massapez é muitas vezes designado na sua forma escrita pelo vocábulo maçapez. O Doutor Gaspar Frutuoso, sempre usou a palavra massapez, e igualmente, os autores Silva e Meneses (Elucidário Madeirense).
Sítio dos Barreiros - São Martinho - Funchal
(Foto do autor)
«O massapez é uma terra contendo grande quantidade de argila ferruginosa, pardacenta, conservando por muito tempo a água que embebe e o salão é avermelhado e menos denso», in Elucidário Madeirense (Silva e Meneses, 1946) - Fotos do autor.
Bibliografia:
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GOMES, Celso de Sousa Figueiredo e SILVA, João Baptista Pereira (1997). Pedra Natural do Arquipélago da Madeira, Importância Social, Cultural e Económica. Madeira Rochas - Divulgações Científicas e Culturais. Câmara de Lobos.
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SARMENTO, Alberto Artur (1941). As Pequenas Indústrias da Madeira. Oficinas do Diário de Notícias. Funchal.
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