04/04/2008

ÁGUA DE PENA, PENA OU PENHA E PENA DE ÁGUA

Água de Pena - Calhau do Seixo
(Aeroporto Internacional da Madeira - Foto do autor)


ÁGUA DE PENA - A origem do nome desta freguesia, pertencente ao concelho de Machico, «várias hipóteses se têm aventado para a explicar», segundo o Elucidário Madeirense. Alguém quis afirmar que o «nome primitivo era Água de Penha e não Pena». Esta denominação, proviria da «água a brotar duma penha ou rocha viva, e que com o decorrer dos tempos se daria a corruptela de Penha em Pena». E, «para justificar esta explicação, tornava-se mister a existência, em qualquer ponto a dentro da área» da freguesia, «dum manancial a sair da rocha, o que nos parece se não verifica ali». Porém, «é certo que, num antigo nobiliário, lemos que 'deriva duma fonte cristalina de veio contínuo na sesmaria de Henrique Teixeira, que teve grossas terras para oeste da villa de Machico'». Será, «a Fonte do Seixo ou outra que tivesse desaparecido?» «Não é hoje fácil sabê-lo». Interrogam-se os autores do supracitado Elucidário. E presumem que, «por ali houvesse algum sítio ou lugar com o nome de Água de Pena desde os tempos primitivos da colonização e deste modo desse origem à denominação da paróquia. Em alguns documentos antigos, se encontra este nome com a grafia de Água de Penã».

Água de Pena, vista do Pico do Facho - Machico
(Foto do autor)

PENA ou PENHA - Segundo o Dicionário de Língua Portuguesa, estes vocábulos também podem designar, fraguedo ou rocha, para além de outro significado que estes possam ter. Todavia, estes vocábulos também são usados como topónimos em outras regiões de Portugal.
No arquipélago madeirense, existe os topónimos pena e penha. Por exemplo, Pena é um lugar da freguesia de Santa Luzia, no Funchal, em parte, sobranceira à Ribeira de João Gomes, junto a uma das suas margens, curiosamente no cimo de uma penha, fraguedo ou rocha.


Pena - Funchal
(Foto do autor)

Mas, segundo o Elucidário, «provém êste nome da antiga capela de Nossa Senhora da Pena, que ali existiu». Teria sido Nossa Senhora da Penha? Neste lugar existe ainda a Rua da Pena, antigamente denominado de Caminho da Pena (antiga Avenida de Pedro José de Ornelas). Por outro lado, também existe no Funchal, uma rua denominada de Rua da Penha de França, onde fica situada a capela de Nossa Senhora com o mesmo nome, entre o Hotel Savoy e o Casino. Existiram e ainda existem na Madeira muitas capelas de evocação a Nossa Senhora da Penha de França.
No Porto da Cruz, a Penha d’Águia faz jus do seu topónimo que bem representa uma imponente penha.

Penha d’Águia
(Foto do autor)

PENA DE ÁGUA - Analogamente, estes vocábulos podem ser confundidos com o topónimo Água de Pena. É comum os madeirenses parafrasear que têm “água de pena em casa”. Uma “pena de água” é um cálculo ou medida da água potável, ainda usada na Madeira, que se exprime pela quantidade de água necessária para encher um litro ou cerca de «três quartilhos» no espaço de um minuto. Uma pena pode ser subdividida, em meias penas e quartos de pena. Em regra, no abastecimento doméstico são vendidas aos quartos de pena. Por outro lado, oito penas é equivalente a um anel. E, dezasseis anéis são iguais a uma manilha. Uma manilha, também pode ser, um determinado caudal de água a sair num orifício com um palmo de circunferência. Assim, a manilha, o anel, e a pena eram as medidas usadas para calcular o caudal das águas, antes da entrada em vigor do sistema métrico decimal (metros cúbicos).


Levada
(Foto do autor)




Freguesia de Água de Pena

Água de Pena - Machico
(Foto do autor)
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Segundo o Dicionário Corográfico do Arquipélago da Madeira, a Freguesia de Água de Pena fica encravada entre as freguesias de Santa Cruz e Machico, é limitada ao Norte por esta última e pela do Santo da Serra, ao Sul pela de Santa Cruz, a Leste pelo oceano Atlântico e a Oeste pelas freguesias de Santa Cruz e do Santo da Serra. Fazia parte dos Concelhos de Santa Cruz e Machico, pertencendo ao primeiro dos sítios povoados da Torre e Ventrecha e ao segundo os da Bemposta, Lombo, Lugarinho, Igreja e Queimada. Actualmente a Freguesia de Água de Pena, pertence unicamente ao concelho de Machico, depois de serem desanexados os sítios povoados da Torre e Ventrecha, passando estes a pertencerem à freguesia de Santa Cruz.


Água de Pena
(Foto do autor)

Água de Pena é banhada pelo Mar numa relativa extensão, e tinha a servi-la um pequeno porto com uma praia de seixos rolados a que chamavam o Calhau do Seixo, situado na foz da ribeira do mesmo nome. A montante do mesmo calhau, existe ainda hoje a Fonte do Seixo, muito próximo da Ponte do Seixo, também sobre a ribeira do mesmo nome. Na década de 90 do século XX, devido ao aumento da pista do Aeroporto de Santa Catarina ou do Funchal, o Calhau do Seixo deixou de existir, passando este a constituir um enroncamento marítimo onde foram construídos os pilares de suporte à pista do actual Aeroporto Internacional da Madeira, com este nome, após a última ampliação da pista, inaugurada em 2000. Por baixo da pista do Aeroporto foi construído um complexo desportivo designado de Água de Pena.


Complexo Desportivo de Água de Pena
(Fonte)


Tem como orago a virgem e mártir romana Santa Beatriz, ficando a respectiva Igreja Paroquial no sítio chamado da Igreja. Além deste templo, possui a capela do Sagrado Coração de Jesus, no sítio dos Cardais, fundada em 1907 pelo cónego Henrique Modesto de Betencourt, e a de Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, construída por Francisco de Freitas Correia, no ano de 1924, no sítio da Queimada.
Os terrenos desta Freguesia são regados pelas levadas do Juncal e Levada Nova do Furado, que têm a sua origem nas vertentes do Pico do Areeiro e serras do Faial (Ribeiro Frio), e ainda pelas levadas do Moinho da Serra, nascida na Freguesia de Santa Cruz, Levada Nova, que encabeça na Ribeira de Machico e a do Lugarinho, cujo caudal parte do sítio com o mesmo nome.






A Freguesia de Água de Pena e a Revolta da Madeira de 1931



Em Fevereiro de 1931, na sequência de graves perturbações de ordem pública na cidade do Funchal, causadas pela promulgação de um decreto do Governo, que estabelecia um novo «regime cerealífero e restringia a livre importação de trigos e farinhas», durante cinco ou seis dias, o comércio da cidade paralisou, e estiveram encerrados todos os estabelecimentos, repartições públicas e escolas. O motim ou «revolta popular» continuou, mesmo depois do decreto ter sido suspenso. Os amotinados ou revoltosos, exigiam sua integral revogação.
Segundo o Elucidário Madeirense, «no dia 6 de Fevereiro, os motins revestiram uma alarmante gravidade com o violento assalto á fabrica de moagem dos Lavradores, a uma importante casa de ‘atacados’ na rua Cinco de Junho, a uma padaria na Ponte de São João e a um estabelecimento comercial na rua da Alfândega, etc. etc., que ficaram inteiramente destruídos, sendo os prejuízos causados de alguns milhares de contos de réis. Interveio a polícia havendo morrido três populares e sendo também vitima um dos membros daquela corporação. As forças de infantaria que saíram do quartel para restabelecer a ordem, não quiseram ou não souberam fazê-lo, e a elas se ficou atribuindo, em boa parte, a responsabilidade desses tão lamentáveis acontecimentos».
Neste período em que se acentuavam os factores de crise económica e social na Madeira, oficiais exilados pelo regime político saído do golpe militar de 1926, aproveitando-se do descontenta-mento popular, revoltaram-se contra o regime instalado na República Portuguesa. A 4 de Abril, no Funchal, assumiu o poder do arquipélago madeirense, uma auto intitulada “Junta Revolucionária”.


Machico
(1940)


Entretanto, as forças revoltosas prepararam e organizaram a defesa militar da ilha, contra possíveis invasões forças militares enviadas pelo Governo, com a finalidade de restabelecer a ordem. E assim aconteceu! Após um desembarque de forças governamentais no Caniçal culminou com um ataque aos revoltosos instalados defensivamente nas montanhas e picos e circundantes a Machico e à rendição dos mesmos.


(Progressão das tropas governamentais vindas de Machico para Água de Pena, a caminho de Santa Cruz. Foto Perestrelos 1931. Fonte, Arquivo Regional da Madeira.)


Em direcção ao Funchal, a progressão das forças governamentais foi dificultada pela dinamitação de pontes, de entre as quais, a Ponte do Seixo em Água de Pena. É neste contexto que esta Freguesia entra para a história da Revolta da Madeira de 1931, também conhecida pela “Revolta da Farinha”.

(Ponte do Seixo em Água de Pena, destruída pelos revoltosos. Passagem improvisada pelas tropas governamentais com a ajuda de populares. Foto Perestrelos 1931. Fonte, Arquivo Regional da Madeira.)





Bibliografia:

 
COSTA, J. Almeida e MELO, A. Sampaio (1990). Dicionário Editora de Língua Portuguesa. Dicionários “Editora”. 6.ª Edição. Porto Editora Lda. Porto.
SERVIÇO Cartográfico do Exército (1974). Carta Militar. Serie P 821. Edição 1 - S. C. E. P. (Trabalhos de Campo de 1965). Lisboa.
SILVA, Padre Fernando Augusto da e MENESES, Carlos Azevedo de, (1984). Elucidário Madeirense. Fac-símile da edição de 1946. Secretaria Regional de Turismo e Cultura - Direcção Regional dos Assuntos Culturais. Funchal.
SILVA, Padre Fernando Augusto da (1934). Dicionário Corográfico do Arquipélago da Madeira. Edição do Autor. Funchal.